Surpresa

VOCÊ PODE SAIR DA BAHIA, MAS ABAHIA NÃO SAI DE VOCÊ…

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Estava vindo de Salvador para São Paulo, num vôo no início duma noite de verão. Sempre que o avião começa a taxiar, faço as minhas orações para ter um bom vôo e todos chegarmos bem aos nossos destinos. Depois disto, fico olhando pela janela, pois sempre escolho viajar nessa posição.

Naquele vôo, depois de fazer as minhas orações, fiquei, como de costume, olhando pra fora, avistando as luzes que começaram a se acender dentro do aeroporto… Há sempre um que de melancolia nestes momentos. Enquanto o avião taxiava para se alinhar na pista de decolagem, divaguei pensando na minha família, pais e irmãs, que estavam ficando na minha terra natal, no mar azul e nas praias ensolaradas, nas quais havia nadado durante todos aqueles dias, que passei ali, nas saudades, que pareciam não ser suportáveis de aguentar quando eu chegasse de volta a São Paulo… Olhei então para as outras pessoas e uma passageira com cara de gringa, sentada na primeira fila, me chamou especial atenção porque chorava bastante, tendo chamado a aeromoça e falado algo baixinho a ela em inglês.

O avião percorreu toda a parte inicial da pista, me concentrei para aqueles minutos de frio na barriga da decolagem e ele continuou a acelerar. Fechei os olhos e, ao olhar mais uma vez pela janela, vi passar todo o cenário novamente. Como assim estávamos voltando para o finger? Lentamente, o avião se aproximou do lugar de onde havia partido e logo me pus a pensar: Será que deu algum defeito, meu Deus? Por que voltou depois de estar preparado para subir?

Dei uma olhada discreta nas poltronas à minha volta e os rostos dos passageiros eram igualmente surpresos. A tal passageira da primeira fila, continuava a me chamar a atenção. Ela chamou novamente a comissária e lhe falou algo baixinho. A comissária, por sua vez, chamou um outro comissário, que se dirigiu à cabine do comandante. Silêncio e expectativa dentro do avião. À essa altura, eu já não conseguia mais disfarçar o meu interesse pelo desenrolar da história. O que será que estava acontecendo? Os comissários então voltaram e disseram à moça que ela poderia desembarcar, ao que ela prontamente atendeu com visível euforia. Pegou rapidamente as suas malas de mão, a porta dianteira foi aberta e ela desceu bastante agradecida.

O avião taxiou novamente e repetiu todo o movimento já feito antes. Confesso até que fiquei bastante intrigada e preocupada pelo fato de só aquela moça ter descido, após o avião quase ter decolado. Por via das dúvidas, também repeti todas as minhas orações pré decolagens – melhor dar um reforço, diante de fatos inusitados.

Lá pela metade do vôo, resolvi discretamente perguntar à aeromoça o que havia acontecido de fato. Aí, ela me contou a inusitada história: A tal passageira, que ia, mas não foi para São Paulo era inglesa e estava voltando da Bahia para a Inglaterra, via São Paulo, depois de um mês de férias na Terra da Felicidade. Chorava inconsolável porque havia concluído que não queria mais voltar, pois havia se apaixonado por um baiano e já estava arrependida de ter embarcado, deixando para trás a sua paixão. Num lance absolutamente cinematográfico, conseguiu convencer a tripulação e o comandante a voltar e deixá-la descer para reencontrar a felicidade, que havia descoberto em Salvador. E assim foi feito. Juro que só havia visto algo dessa dimensão num aeroporto, na cena final do filme Dio Come Ti Amo, ao qual assisti por nove vezes, na infância. Em ambos os casos, confesso, foi lindo demais!

Nunca soube nem nunca saberei o final daquela história de amor, mas sempre que estou saindo de Salvador, naquele mesmo aeroporto, me lembro daquela atitude apaixonada e me vem à mente uma frase muito baiana: “Você pode sair da Bahia, mas a Bahia não sai de você”.  Oh, Bahia aiá, Bahia, que não me sai do pensamento oi…

Ceiça Schettini